Desde o início da invasão russa à Ucrânia, os países ocidentais utilizam um mesmo método para “conter” o avanço russo contra o Ocidente: as sanções econômicas. Mas será mesmo que elas fazem esse trabalho? Trump dá sinais de ampliar ainda mais essa suposta solução.
Em sua rede social, o presidente Donald Trump demonstrou cansaço das negociações. Em um post, disse que Putin estaria “brincando com fogo”. O que ele quer dizer?
Segundo o jornal The Wall Street Journal, Trump pode estar prestes a ordenar a aplicação das maiores e mais pesadas sanções contra a Rússia, potencialmente capazes de fechar definitivamente as últimas ligações comerciais daquele país com alguns mercados internacionais. Não há dúvidas de que essas sanções, se aplicadas, afetarão indiretamente o Brasil, que será impedido de comprar diesel e fertilizantes russos. No entanto, para além da análise puramente econômica, há uma vantagem russa em matéria narrativa e ideológica que poderá fazer toda a diferença para o seu projeto expansionista.
Como sinalizou recentemente um chanceler russo, as sanções estão claramente ajudando Putin a identificar e se livrar dos adversários internos que tem, pois eles são identificados pela crença na necessidade de relação comercial com o Ocidente, com todo o mundo, uma premissa liberal que a nova Rússia quer se livrar. O que ocorre na Rússia desde o início da guerra, segundo os próprios analistas nacionais, é uma rede de perseguição governamental não apenas a quem seja contra a chamada “operação militar”, mas a todos os que se mostrem contrários às sanções internacionais impostas pelo Ocidente como um “castigo”. Sim, o Kremlin deseja e anseia por mais sanções, pois é isso o que abastece e alimenta sua agenda atual anti-Ocidente e antiliberal.
Não é apenas a doutrina comunista, supostamente abandonada pelo Kremlin em 1991, que defende a estatização e o controle governamental, fechamento econômico para o fortalecimento da economia nacional. Todo e qualquer país ou governo que esteja se preparando para uma guerra duradoura precisa previamente fechar-se e garantir uma autossuficiência econômica. Não à toa, essa tem sido a plataforma política de uma série de outros países, coincidentemente um dos critérios para a nova conjuntura do BRICS.
Nisto, Trump e os globalistas estão claramente alimentando o monstro que ameaça, a cada dia, o Ocidente, começando pela Europa. E o que eles vão ganhar com isso? O mesmo que Putin em sua narrativa: mais uma oportunidade para lucrar com uma ameaça.
Para os globalistas, que acostumaram-se a tirar vantagem de ameaças mundiais reais ou imaginárias, a Rússia é a grande chance de um novo aquecimento global, uma nova pandemia ou, o que é ainda melhor: uma guerra mundial que renovará a legitimação do controle e ampliação do seu poder. Mas desta vez o eixo global tenderá a parecer “renovado”, mais igualitário e marginal, na narrativa dos BRICS e de uma Nova Ordem Multipolar do sistema “antissistêmico”
Líderes populistas, como Trump, também lucram com o aumento de uma ameaça global. Não é à toa que o populismo, seja ele de direita ou de esquerda, sempre foi a aposta da antiga URSS e agora da Rússia: a ideologia revolucionária, que é matriz tanto da esquerda e da direita “idiota útil” atual, sempre necessita de uma ameaça externa ou mundial para se manter de pé.
Trump possui um histórico de colaboração com o Kremlin e não o contrário. A mídia russa faz questão de lembrar a fraqueza de Trump quando se trata de enfrentar a Rússia, o que corrobora a encenação dele nas redes sociais.
Após a fala “dura” de Trump, a estatal russa RT news publicou o post do presidente Trump, destacando as suas falas, principalmente a parte em que Trump diz que “Putin está brincando com fogo”, com a estatal russa finalizando com:
“Até ele postar o oposto amanhã de manhã”, escreveu o perfil da RT.
Uma referência às raras vezes em que Trump demonstrou uma postura firme contra Putin, mudando radicalmente para o habitual tom ameno e cordial alguns dias depois. Em outra ocasião, Trump chegou a dizer que estava “estranhando” Putin, que segundo ele “conhece há anos”. Já destacamos o histórico de colaboração de Trump com o Kremlin em outro texto.
Da esquerda para a direita, a fábrica de idiotas úteis
Assim como no final da Segunda Guerra Mundial, tanto a direita quanto a esquerda auxiliam-se mutuamente para a ampliação de uma área de consenso global. Tal consenso, paradoxalmente, caminha por meio de um embate, uma tensão inevitável, como sempre ocorre.
Depois de utilizar as utopias marxistas e dos operários de todo o mundo de uma revolução proletária, a Rússia aposta, agora, a fantasia de um “retorno das tradições”, o que lhes permite cooptar a ação e o movimento extraído do cansaço com os excessos esquerdistas. Os idiotas úteis, agora, são os da direita, como bem mostramos no livro recém lançado Não seja um idiota útil: muito além do noticiário político, ainda disponível pelo link.