Um inquérito policial que apurava a execução brutal de um jovem indígena em uma tribo da etnia Munduruku, no Pará, foi arquivado pela 2º Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, após o órgão entender que os índios possuem direitos étnicos à prática do assassinato. Apesar de revoltante, a decisão obedece ao entendimento do Artigo 231 da Constituição, além de convenções internacionais que protegem a autodeterminação dos povos.
O entendimento polêmico relembra o tabu dos infanticídios, em que índios enterram vivas crianças indesejadas por deficiência ou outros motivos.
A Constituição brasileira reconhece o direito à resolução de conflitos por métodos próprios tradicionais indígenas, ao dispor que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições”, explica o site do Conjur.
A história começa quando uma mulher indígena denunciou à Delegacia de Polícia Civil de Itaituba, no Pará, contando que o filho de 16 anos havia sido morto a tiros por outros indígenas dentro de sua casa. Depois dos tiros, os índios teriam levado seu corpo até o rio, onde foi esquartejado em pequenos pedaços, retirado o fígado e o coração, triturando-os. O resto do corpo do rapaz foi jogado no rio com pedras amarradas. Segundo informaram as autoridades, trata-se de um ritual tradicional e inocente dos Munduruku.
Os pais do rapaz foram imediatamente questionar o pagé, o capitão e o cacique da aldeia, que explicaram a necessidade daquela execução: de acordo com eles, o jovem havia praticado feitiçaria.
O caso é informado em uma postagem do site jurídico Conjur, em que a autora Ana Luisa Saliba justitica a decisão através das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que discrimina, dentro do Brasil, as chamadas “nações indígenas”, que teriam, segundo o órgão internacional, regras próprias que devem ser respeitadas pelo estado brasileiro.
O site Conjur explica a decisão do procurador para o arquivamento do inquérito:
“O procurador da República oficiante promoveu o arquivamento em razão de um parecer técnico, feito por um analista especialista em antropologia do MPU (Ministério Público da União), que revelou que a dinâmica dos fatos praticados indicavam efetivamente a prática de um ritual próprio da etnia”.
Ou seja, sendo verdadeira a acusação feita pelas lideranças indígenas, fica justificado o justiçamento, a morte por execução, pena existente dentro da tradição dos Munduruku e protegida pela legislação.
Na revisão de arquivamento, o subprocurador-geral da República Francisco Vieira Sanseverino evocou os dispositivos internacionais para sustentar que “os povos indígenas são culturalmente diferenciados”.
O relativismo cultural das convenções internacionais chega ao ponto de inserir como “direito à autodeterminação” um direito à execução e ao assassinato dentro do estado brasileiro.
“A Convenção 169 da OIT dispõe que a justiça indígena deve ser reconhecida e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas também reconhece que “os povos indígenas têm direito à autodeterminação”, que se revela no direito de se reconhecerem como grupos distintos e, portanto, de terem controle sobre seu próprio destino”, explica o site do Conjur.
Assim, a autora da insólita matéria utiliza esses argumentos para justificar que o estado brasileiro (e por que não os próprios cidadãos) entendam que o assassinato praticado contra outro ser humano pode não ser errado se ele pertencer a uma tribo indígena protegida por legislação internacional.
“Os índios, de acordo com seus usos e costumes, aplicam sanções aos que transgridem as normas de convivência estabelecidas pelo grupo a que pertencem. Trata-se de uma das formas de expressão do direito ao auto-reconhecimento, ressaltou o subprocurador-geral”, diz a autora.
Riscos à saúde
O absurdo da interpretação chega a um nível ainda mais doentio quando se esclarece que a prática da magia negra, pelos índios, é a única coisa punida com pena de morte, já que é dessa forma que os índios explicam doenças e problemas sanitários da tribo. Em defesa da “saúde pública” indígena, portanto, até o assassinato de seus semelhantes pode ser justificado e absolutamente compreensível.
De acordo com o parecer técnico do MPF e na nota técnica da Funai, “no código criminal dos índios Munduruku, a prática de magia negra é a única conduta possível de pena máxima e que os indígenas se mostram extremamente insatisfeitos com a exposição do caso para fora da sociedade Munduruku”.
“Eis que a crença na pajelança braba está intimamente ligada a saúde do povo da aldeia, ligado a momentos em que a comunidade se sente ameaçada por grande crise, males, doenças e mortes inexplicáveis”, explica o órgão.
Finalmente, a autora justifica que atrocidades cometidas por indígenas devam ser tolerados devido ao fato de que eles “não reconhecem ter feito algo proibido”.
“Para eles, a norma penal não alcança a pretendida função motivadora, tampouco alcançaria qualquer fim preventivo, geral ou especial, a imposição de uma pena”, justifica Ana Luisa Saliba.