Em depoimento da CPI da Covid, o presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, admitiu que a lógica de mercado prevaleceu na hostilização da hidroxicloroquina que orientou a Anvisa a exigir receita médica para a compra do medicamento. A explicação confirma o que se vem falando desde o início da pandemia, de que a demonização dos medicamentos para tratamento precoce refletem uma pressão da indústria farmacêutica.
Em sua resposta ao questionamento do senador Marcos do Val (Podemos), Barra Torres informou que a função da Anvisa é, além da regulação dos medicamentos, também a de mercado. Ele explico que havia uma preocupação com o aumento da procura pela hidroxicloroquina no início da pandemia, quando o presidente Jair Bolsonaro fez sucessiva propaganda do medicamento. De um lado, o receio de desabastecimento e, de outro, o baixo interesse de parte da indústria farmacêutica por um medicamento com baixa lucratividade.
“A Anvisa teve que tomar, como reguladora de mercado (…), nós vislumbramos que produtos utilizados no tratamento offlabel estavam levando a um consumo maior sem a probabilidade de reposição por parte dos próprios produtores. Principalmente no caso da cloroquina e hidroxicloroquina, que são medicações de um custo de produção relativamente baixo (principalmente a cloroquina), que acaba não interessando muito certos produtores que preferem produtos mais custosos e que tenham um retorno de mercado melhor”.
O presidente da Anvisa explica que não houve uma adaptação do setor produtivo à demanda e relata casos de pessoas que compravam e reutilizavam as receitas comuns exigidas para comprar muitas caixas do medicamento, fazendo estoque de produto.
“Então foi necessário que a agência realizasse, por tempo determinado (e já foi revogado isso), a ortodoxia maior na questão da receita”, informou, referindo-se à receita especial exigida, em que uma via fica retida pelo farmacêutico. “E com definição também de quantidade máxima exigida por cada pessoa”, disse o presidente da Anvisa.
Barra Torres admite que isso gerou críticas à agência, no sentido de que estaria dificultando o acesso da medicação às pessoas, o que poderia estar provocando mais mortes de Covid-19. Segundo ele, o intuito não foi este.
O presidente esclareceu que os estudos que comprovam a eficácia da hidroxicloroquina não foram ainda efetivamente feitos e que a Anvisa lida apenas com o uso da bula do remédio e não o uso off label, que cabe às entidades de classe como Conselhos Regionais de Medicina, etc.
Ele concordou com o senador de que é equivocado afirmar que seja comprovado cientificamente que a hidroxicloroquina seja ineficaz, uma vez que os estudos de uso precoce ainda não foram feitos suficientemente para as exigências formais da Anvisa, o que é diferente do uso off label.
“O que vemos na comunidade científica atual sobre este medicamento é que muitos estudos foram feitos sem método e que os que utilizaram metodologia mais ortodoxa são estudos que darão resposta em um tempo mais à frente, principalmente quando ao uso leve”, explicou.